AMOR VIRTUAL
Conheci, recentemente, uma pessoa muito especial e de uma sensibilidade impecável: doutora em psiquiatria e uma inteligência acima da média. Eu tenho convivido virtualmente com uma mulher encantadora, meiga, cheia de ternura e, acima de tudo, extremamente consciente e politizada.
Estamos vivendo um amor bonito, apesar de ela insistir que sejamos apenas amigos virtuais. Não vejo problema algum em sermos amigos; mas o sentimento que nos tem nutrido, em nosso relacionamento virtual, vai além das fronteiras da singela amizade. Temos uma afinidade emocional, cultural e espiritual que poucos casais reais possuem – que impressiona os meus sentidos aguçados de veterano em matéria de um grande amor entre duas pessoas, que apesar de muitas qualidades morais e intelectuais, encontram-se navegando em solidões.
É fácil para eu entendê-la quando me diz que o nosso relacionamento virtual não passa de apenas uma linda amizade, pois, no seu passado, relacionou-se, virtualmente, durante quatro anos, apaixonando-se, e sofrendo uma ingente desilusão. O seu amor virtual a havia enganado nos seus propósitos amorosos, e, em verdade, não estava apaixonado por ela. Queria apenas passar o seu tempo, nada mais. O afeto que demonstrara, no tempo do relacionamento virtual, era tão-somente para adquirir a confiança necessária em ser nada mais que um paquerador virtual irresistível.
Todos nós temos as nossas frustrações amorosas, e ficamos, com isto, pessoas desconfiadas e precavidas contra os acontecimentos emocionais de nossas vidas, tanto que, muitas vezes, nos encontramos envolvidos na teia do desamor, impedindo-nos te enfrentarmos, com naturalidade, as afeições verdadeiras de um novo amor.
O amor virtual é, de fato, uma maneira muito insólita de amar, mas qualquer maneira de amar vale à pena. Mesmo que a impossibilidade de tocarmos em nossos corpos físicos atormente-nos de forma angustiante e visceral, não podemos abater-nos diante deste impasse tão complexo e material. Pois não é a alma que ama? Então, podemos nos apaixonar normalmente um pelo outro, sem que seja preciso o contato físico para oficializar o teor dos sentimentos mais cálidos.
Eu, à minha maneira, estou amando uma mulher, que pode não ser a mais bela do mundo, mas que, para mim, simplesmente tem os quesitos necessários para um homem como eu – humilde poeta! Tenho cá os meus defeitos também e, com certeza, não sou o homem mais belo do mundo. Mas os meus sentimentos são valiosos, são puros e bem intencionados. E apesar das coisas às vezes não darem certas, eu acredito sempre na possibilidade de amar e ser amado intensamente. Sem ter a preocupação com o futuro, pois o futuro a Deus pertence, não é mesmo? O importante é estar amando, ainda que virtualmente.
Não posso deixar de questionar o inevitável. É possível que o amor virtual nunca consiga tornar-se real. Uma coisa é se apaixonar pela alma do outro; outra coisa é manifestar este sentimento fisicamente, através da pele, do cheiro e das formas conjugais dos parceiros. O amor virtual acaba justamente quando ele deixa de existir, tornando-se real, palpável. Ainda que, algumas vezes, ele se torne ainda mais intenso com a aproximação dos corpos: então, temos o êxtase dos amantes.
Com o advento do mundo tecnológico, do mundo informatizado e com o uso da internet globalizada ficou muito fácil a comunicação entre duas pessoas fisicamente muito distantes. A distância não é um empecilho para que os namoros virtuais aconteçam. E cada vez mais, as pessoas procuram se comunicar através do computador, para encontrarem os seus parceiros idealizados. Mas como a maioria das pessoas costuma não ser sincera virtualmente, ocorre que a decepção amorosa tem sido a marca registrada nos relacionamentos virtuais. É preciso muita cautela e muita inteligência para se conhecer verdadeiramente uma pessoa virtual. É muito fácil enganar o parceiro, ou a parceira, quando nossos olhos, que são a janela da alma, estão totalmente dissipados da realidade.
No meu caso, pelo que me parece, está havendo, de fato, uma grande afinidade e uma grande sintonia amorosa, ainda que a amizade tenha sido a grande responsável pelo discernimento etéreo dos parceiros. Qual a durabilidade de uma relação virtual? Impossível saber. Mas como tudo na vida material é efêmero, é provável que um amor virtual dure o suficiente para não se tornar, desgastantemente, um amor verdadeiro – cheio de atribulações cotidianas cansativas e, sobretudo, causador da dolorosa separação conjugal.
FERNANDO PELLISOLI
Enviado por FERNANDO PELLISOLI em 21/09/2010