AS NOTÍCIAS DO JORNAL
Lembro-me, ainda, depois de tanto tempo que já passou, da recomendação do meu professor de Teoria Geral do Estado - senhor Adalberto, sobre a necessidade de se ler jornal todos os dias. Dizia ele, em bom tom, que o sujeito que não lê jornal é um imbecil. Um verdadeiro idiota! E eu confesso que tentei ler jornal todos os dias; mas, literalmente, não consegui. Vivia mais para o meu mundo interior do que para as notícias dos jornais. Além do mais, eu já tinha que aturar as notícias do jornal televisivo, enquanto, num intervalo e outro, acabava, sempre, escrevendo poesia. Essa era a minha sina: ser apenas um poeta que canta as dores do seu próprio eu. Nada, além disso.
Mas o que o meu professor disse me perseguia, pois eu não aceitava muito bem a idéia de ser um idiota. De, realmente, não ter nenhum interesse de me informar sobre os problemas do mundo, pois o meu mundo poético já era cheio de adversidades insuportáveis de serem vividas. Porque teria eu de me preocupar com os problemas do mundo, de revolucionar o que os homens não queriam que fosse revolucionado. É claro que, no poema, a minha voz poética se preocupa com o mundo. É, quem sabe, até seja revolucionária. Mas isso não muda o mundo, nem as famigeradas notícias dos jornais. O mundo continua desafiando as leis de Deus, devido ao seu interesse mesquinho e mundano da vil Economia.
Porque eu devo ler jornal se eu sei que um avião está caindo neste momento, que homens estão assaltando bancos, que políticos estão enganando o povo com suas antigas retóricas, que a corrupção alastra-se vertiginosamente, que o povo paga impostos e morre de fome, que o império das drogas continua viciando jovens inocentes, que os casais estão se separando, que os Sem Terra continuam, absolutamente, sem terra, que a minha indignação não altera as notícias dos jornais... Porque, então, eu devo ler jornais? Para não parecer um idiota? Na verdade, somos todos idiotas – nós que fazemos parte das massas que aceitam toda a espécie de degradação humana. Será que lendo jornal eu posso mudar o mundo? Será que lendo jornal eu posso fugir das atrocidades do mundo? Será que lendo jornal eu posso ser menos infeliz? É verdade, escrevendo os meus poemas eu consigo ser momentaneamente feliz. E isto me basta. É o conforto da minha alma sofrida. É a paz que eu encontro dentro de mim mesmo. Então eu pergunto: porque devo ler jornais? Para me atualizar das besteiras do mundo? Prefiro me atualizar das minhas próprias besteiras literárias. Prefiro, enfim, ler a mim mesmo.
Talvez eu seja um imbecil, mas eu prefiro ler um bom livro a perder tempo lendo jornal. O jornal a gente joga fora no mesmo dia, sem ter lido um terço das notícias; o livro a gente lê até o seu fim, e, ainda, o guarda na estante para fazer novas releituras. Será que ler jornal é mais relevante do que ler um bom livro? Ler Machado de Assis, ler Mário Quintana, ler Cecília Meireles, ler Fernando Pessoa, ler Manoel Bandeira, ler Fernando Sabino, ler Vinício de Moraes, ler Allan Kardec... Penso que ter me enveredado pelo caminho estreito da literatura não me levou pelo caminho da imbecilidade; ao contrário, a riqueza do meu mundo interior não perde à riqueza do meu professor que lia jornal todos os dias. Agora, se você gosta realmente de ler jornal eu, infelizmente, não tenho nada contra. Acho que o jornal é bastante informativo, e se você tem paciência para ler jornais todos os dias, eu não vejo nenhum mal nisso: seja feliz!
Eu juro, eu já tentei ler jornal todos os dias. Principalmente quando eu fui empresário. Mas assinar jornal não me dava frutos; mas prejuízo: pagava uma quantia todos os meses, e não lia mais do que algumas folhas do jornal. E depois o jogava fora, literalmente. Eu sinto muito desagradar o meu professor universitário, mas, irremediavelmente, não nasci para ser leitor de jornais. Com o advento da televisão informativa, não vejo a menor necessidade de existir jornais e revistas, pois eu, indubitavelmente, prefiro os livros. Por acaso não são os livros o veículo de informação acadêmica? A nossa vida estudantil inteira não foi alicerçada através do estudo livresco? Porque, então, perder tempo lendo jornais?
Eu sei que os donos de jornais, ao lerem esta crônica contrária aos jornais, não vão gostar nada disso. Talvez eu até receba uma correspondência desagradável, ofensiva, colocando-me no meu devido lugar. E eu vou, com certeza, levando os livros e nenhum jornal. Nada, nem ninguém, vão mudar o meu modo de pensar. Que coisa eu tenho se não consigo ler jornal? Eu poderia ler uma crônica ou uma poesia no jornal, mas por quê? Eu tenho livros; não preciso de jornais!
Eu espero que esta crônica não interfira na vontade do leitor de jornal. Não tenho a intenção de levantar bandeira alguma contra o ato de ler jornal. Cada um que leia ou não o que bem entenda. Não tenho a menor preocupação de influenciar alguém a não ler jornal. Leiam jornais sempre! Mas eu não posso comungar com a idéia de que não ler jornal é idiotice. E eu tenho o direito de não ter o hábito de ler jornal. Definitivamente, eu não gosto de ler jornal, eu não gosto de ler revista, pois é no livro que eu encontro a sabedoria espiritual que evolui o meu espírito. É no livro que eu consigo acreditar que o mundo será muito melhor.
FERNANDO PELLISOLI
Enviado por FERNANDO PELLISOLI em 19/09/2010